Eu poderia ouvir seu coração batendo. Eu poderia ouvir nossos
ruídos embriagados de amor. Ela chegou tão trêmula e molhada da
chuva fininha. Eu a abracei e dividi sem reservas todo o meu calor.
Eu não perguntei nada, apenas sequei seus cabelos e sem perceber
inteiramente a beijei. Seu corpo molhado junto ao meu labareda. Sua
voz suave e meu silêncio escondendo segredos que depressa revelei.
Eu poderia ouvir seu coração batendo. Eu poderia ver com tristeza o
brilho incerto do seu olhar. Ela se despiu tão lenta. Era um ritual
e eu não queria atrapalhar. Eu a beijei com todo desejo que havia
adormecido em mim. Meu corpo todo despertou. Era dia, eu sei, mas eu
a queria inteira e plena em mim. Era dia, eu sei, mas não há
momento certo para o amor.
Eu poderia ouvir seu coração batendo. Eu poderia sentir suas mãos
percorrendo incertas todo o meu corpo-desejo. Ela toda em mim e eu
todo nela e por ela. Cada pensamento, cada murmurar, cada sorriso
bobo, cada beijo. Era um sonho, talvez. Mas, se era eu nem louco
queria despertar.
Eu poderia ouvir seu coração batendo. Eu poderia ver que ela sempre
esteve esperando e agora decidida vinha ao meu encontro. Palavras
eram nada para expressar o que fizemos e como destruímos aqueles
lençóis e aquela arrumação pálida do meu quarto. Era domingo e
dia santo. Santificadamente, ficamos ali colados um no outro. Ela
respirando em meu peito e eu prendendo o ar. Poderia morrer naquele
instante. Nada mais era como antes. Ela era tudo e aquele instante um
nada. Mas ficamos assim até o chegar da madrugada. A fome não
vinha, o desejo se repetia. Já não era mais dia e o breu tomou
conta de nós. Era noite, eu sei, porém estávamos secretamente a
sós. Eu nunca tive sorte com mulheres. Elas fuga ao longe sempre se
iam de mim. Eu ficava aqui. Lágrimas verti. Consolos mil tentei. Era
domingo santo e eu me apaixonei.
Eu poderia ouvir meu coração batendo. Eu poderia sentir a ereção
voltando e ela sorrindo plena toda para mim. Iniciaríamos nosso
encontro eterno, mas.
De repente, eu não conseguia ouvir seu coração batendo. A vida
corria de nós e eu menino não conseguia segurá-la aqui. Foi
despedida, eu sei. Sequer me espanto. Nunca tive sortes de amar
imensidão. Eu não conseguia ouvir seu coração batendo nem,
portanto, sentia vontade de ouvir o meu também.
Luciana Braga