3.23.2020
Estamos no mesmo barco? Todos estão realmente trancados no conforto dos
seus lares com dispensa e frízer lotados para, pelo menos, quarenta dias? Todos
têm dinheiro para encher os carrinhos no supermercado? Todos compraram álcool
em gel e máscaras cirúrgicas pelo delivery da farmácia mais famosa? Estamos no
mesmo barco e receberemos nosso salário inteiro no final do mês?
Tem gente dizendo que é tempo de reflexão, que os familiares estão com
tédio porque já usaram todos os jogos de tabuleiro. Alguns dizem que fechar
fronteira é exagero, porque a economia não pode parar. Tem gente tirando foto
com máscara só para postar e mostrar pra comunidade virtual que é consciente. Não
culpo ninguém. Não cabe a mim apontar culpados, como fizeram com a China. Como se o Brasil fosse
uma super potência independente! Esse barco não vai afundar ou vamos cantar até
cair. Os memes não param de nos divertir, enquanto os mendigos estão com fome
duplicada porque não há quase ninguém para pedir. As costureiras estão em casa
com roupa limpa e costurada, mas com a bolsa vazia e sem a garantia do amanhã.
Tem pequenos cantores pedindo ajuda para montar a cesta básica do mês. O circo
do meu bairro foi embora e o palhaço não sorriu nenhuma vez.
Estamos no mesmo barco, mas não tem bote para todo mundo. É que alguns
tinham dinheiro e subornaram os funcionários do navio. Disseram que mulheres e
crianças eram prioridade, assim com as senhoras de idade, mas são os jovens que
comandam as multinacionais. Na hora que afunda, todos viram seres irracionais e
lutam pela sobrevivência sem pensar no próximo. É que se minhas mãos estiverem
bem limpas, eu poderei apontar a realidade do outro como se eu a vivenciasse de
fato.
Se nós estamos de verdade no mesmo barco, ele parece o Titanic e o fato é
que aqueles que ofereciam os ditos trabalhos essenciais estão no fundo do
oceano e debaixo da ignorância de quem pensa que somos todos iguais e vivemos a
mesma realidade todos os dias.
Luciana Braga