9.22.2017
A estrada parecia tão imensa quanto a dor que suprimia o meu peito.
Tremi toda quando de longe o precipício avistei. Ele me disse que
ninguém sobrevivera aquela ultrapassagem perigosa. As mãos não
eram mãos, mesmo assim, segurei no volante do meu fusca original e
prossegui.
Não havia ar condicionado reservando-me do calor e do caos do mundo.
Eu era a própria liberdade. O vento sacudia meus cabelos e secava as
lágrimas que não paravam de rolar em meu rosto.
Eu era só e era a multidão. Eu era o caminho, a dúvida e a razão.
Passei por montanhas e lagos e não parei. Ouvi pássaros apaixonados
e não me comovi. Eu prossegui.
De repente o rádio começou a tocar uma antiga canção. Aos poucos,
eu entrei naquele transe da melodia e abruptamente parei. As mãos
trêmulas de medo não ousaram desligá-lo. Em silêncio eu ouvi.
Devagarinho meu corpo cedeu aquele calor gostoso da melodia que toca
até os incrédulos. Eu convulsamente chorei. Lembrei-me das vezes em
que Ele me abraçou e mudou completamente o rumo do meu dia.
Lembrei-me dos beijos e assim diminuiu a minha agonia. O céu mandava
uma chuva fininha, mas meu corpo ardia.
Eu olhei a tristeza no retrovisor e me espantei. Ela sorria e eu
chorei. Ela tremia e eu cansei. Ela vivia e eu já estava morta. Ela
corria e eu pensava no teu corpo ao pé da minha porta.
Era manhã de sábado e eu não tinha ido a lugar algum. Era cedo e
preguiçosamente os lençóis se mexiam e pulavam da cama alvinha.
Era manhã e era só minha. Até que ele entrou no meu quarto e me
cobriu de beijos. Acendeu aos poucos cada recanto de desejo. Sem
falar nada, Ele me convenceu. Era manhã e meu corpo cedeu.
Agora, ele foi levado pelo desespero dos suicidas e eu sigo o mesmo
caminho. Não me importo com as perseguições eternas. Eu já estou
fugindo a tanto tempo. Eu sinto muito, mas não me vejo vencedor.
Sinto tanto, mas só Ele despertou o Amor e agora sem Ele perdi a fé.
Deixa-me seguir e me atirar do alto feito ave que aprende
perigosamente a voar. Deixa-me ir... Deixa-me estar...
O som me prende... A música que renasce vive em mim. Justo eu que
sempre fui um estranho. Justo eu que nunca me senti plenamente feliz.
Justo eu. Justo eu. Justo eu que nem sei...
O silêncio retorna e eu sigo em frente. À beira do precipício,
tudo é imensidão. Pulo do carro ainda em movimento, a boca atropela
o coração. Ele se rompe em pedaços. Eu fico. Eu renasço. Eu sou.
Ele precipício.
Luciana Braga