Se
eu morresse hoje e os meus desejos significassem alguma coisa para os que aqui
ficassem, esse papel seria como uma carta de despedida. Testamento não! Pois,
não sou uma mulher de grandes fortunas. Tudo o que possuo, cabe dentro de mim
somente e quando eu me findar irá comigo para a eternidade: é o meu fôlego de
vida. Já que nem ao menos as roupas que eu visto, posso considerar
verdadeiramente minhas.
Ah!
Antes que eu esqueça, tenho outra coisa muito valiosa que posso considerar
minha: meus poemas. Meus pobres, simples e singelos poemas. São meus! Ninguém
pode dizer o contrário, pois saíram de dentro da minha alma e esta também me
pertence. Vês quantas coisas novas acabei de descobrir que possuo! Mas, será
que meus pensamentos são verdadeiramente meus? Não, acho que não! Visto que os
desperdiço tanto pensando em outras pessoas, ou melhor, aproveito-os, já que
ficar pensando em mim é demasiadamente chato.
Afinal,
quem eu fui? Quem eu sou? E já que estou admitindo que essa seria uma carta de
despedida, nada mais serei...
Talvez
estejam certos, aqueles que dizem que eu sou uma pessoa muito estranha, chata e
esquisita. Talvez estejam certos ou talvez não!
Então
para que estes não fiquem conhecidos como mentirosos, cometerei a minha última
estranheza. Ou melhor, não cometerei, visto que é apenas um pedido.
O
fato é que eu sempre achei os velórios extremamente tristes, mesmo quando o
defunto tinha sido um palhaço em vida, nem assim lembravam-se dele com um
sorriso no rosto, talvez seja a dor da partida...
Mas,
eu quero fazer diferente. Não quero flores, pois para arrancá-las é necessário
matá-las e, além disto, elas murcham tão rápido. Portanto, quero versos por
toda a parte, para que a última lembrança que as pessoas guardarem do meu rosto
pálido e sem vida, esteja ao lado um eterno poema de Drummond... Aquele:
Quero
que todos os dias do ano
todos
os dias da vida
de
meia em meia hora
de
cinco em cinco minutos
me
digas: Eu te amo.
Seria
divino, além de Drummond, também Camões, Cecília Meireles, Rui Vieira, Vinícius
de Moraes, enfim... Podem até tirá-los dos meus cadernos, não terão trabalho
algum, a não ser o de destacar as folhas.
Ah!
Ia me esquecendo dos meus pobres, simples e singelos poemas. Eu poderia dizer
que deixaria cada um deles para um amigo sincero. E confesso que se fosse
citá-los, não gastaria muitas linhas, visto que são realmente poucos.
No
entanto, admito que sentiria saudade da minha pobre mãe e de suas lágrimas em abundância
que seriam derramadas. A minha doce irmã e a sua sensação de derrotada por não
ter conseguido me salvar de mim mesma. Meus outros irmãos, sobrinhos e
afilhados.
E
ele... Sim, ele sofreria tanto ou mais que todos. Ele beijaria a minha mão como
faz todos os dias. Ele me olharia nos olhos, mas não veria mais o brilho do meu
olhar. Ele não conseguiria deixar de me amar. E para sempre de mim ele iria
lembrar.
Luciana Braga